Notícias | 16 de julho de 2004 | Fonte: Valor Econômico

Reajuste provoca a maior crise dos seguros de saúde

As seguradoras e operadoras de planos de saúde estão enfrentando sua maior crise desde a regulamentação desse segmento, em 1998. Executivos das grandes companhias passaram o dia reunidos ontem para decidir como enfrentar a “enxurrada” de liminares judiciais obtidas pelos usuários e os órgãos de defesa do consumidor em todo país contra os últimos reajustes feitos pelos planos de saúde, considerados abusivos.

Helio Novaes, vice-presidente do grupo SulAmérica, controlador da maior seguradora de saúde do país, disse que os reajustes impostos aos clientes dos planos mais antigos – alguns têm até 30 anos de existência no caso da SulAmérica – não repõem “nem de longe” as perdas sofridas pela seguradora neste período. Mas “são necessários para manter o equilíbrio financeiro da carteira”. Questionado sobre a dificuldade de os segurados suportarem reajustes tão altos de uma só vez e se há espaço para um parcelamento, Novaes respondeu: “Estamos dispostos a negociar, desde que seja reconhecido nosso direito aos reajustes”.

O desequilíbrio é real e atinge grande parte das empresas do setor. Uma análise dos balanços de 927 seguradoras e operadoras de planos de saúde (de um total de 2.277 registradas na Agência Nacional de Saúde Suplementar, a ANS) feita pela Capitolio, consultoria especializada nesse segmento, mostra que as operadoras e seguradoras estão trabalhando no limite da liquidez, com R$ 1,20 em caixa para cada R$ 1 de obrigações exigíveis a curto prazo. Como comparação, o índice de liquidez do mercado segurador como um todo é de 2,6 – ou seja, R$ 2,60 em caixa para cada R$ 1 em despesas exigíveis a curto prazo.

O faturamento global com a venda de planos cresceu 7,5% em 2003, o que representou um encolhimento em relação à inflação medida pelo IGP-M, de 8,69%. Analisando o resultado líquido, a consultoria concluiu ainda que 34% das empresas fecharam o ano no prejuízo. O índice de sinistralidade (indenizações pagas sobre prêmios), entre 78,7% a 80,5%, é o mais alto de todos os ramos do mercado segurador, sendo que sete operadoras tiveram mais de 100% de sinistralidade.

Há anos os especialistas na área vêm alertando para o desequilíbrio financeiro causado pelo modelo implantado pela medida provisória que regulamentou a Lei 9656/98, que criou o arcabouço do sistema de saúde suplementar no país. Todo o problema reside na ampliação dos direitos e coberturas dos segurados sem a respectiva ampliação de receitas, no caso dos planos antigos.

O que detonou a crise atual foi a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), tomada em agosto de 2003, de que a o poder da ANS de regulamentar, fiscalizar e impor índices de reajustes não tem alcance sobre os planos existentes antes da Lei de junho de 1998 – os planos antigos. A decisão, tomada sobre uma ação impetrada por um grupo de operadoras em 1999, considerou inconstitucional o artigo 35-E da Lei 9656, que dá atribuição à ANS de fixar regras e reajustes dos planos, mesmo sobre os já em andamento na época. Isso deu margem para as empresas cobrarem toda a defasagem, calculada pela Federação Nacional das Seguradoras (Fenaseg) em quase 90%.

Logo em seguida à decisão do STF, as empresas entraram em acordo com a ANS para reposição da defasagem através da migração e adaptação dos planos velhos para os novos ao longo do tempo, o que vinha sendo feito. Há cerca de um mês, porém, uma decisão da Justiça Federal em Pernambuco suspendeu o acordo.

As seguradoras resolveram então seguir seus próprios critérios de reajuste, o que enfureceu os segurados e os órgãos de defesa do consumidor. Como resposta, a ANS fixou um índice máximo de 11,7%, que foi desrespeitado e gerou novas liminares judiciais. Segundo o diretor de Saúde da Fenaseg, Horacio Cata Preta, as seguradoras estão dispostas a negociar com o governo sobre reajustes, desde que haja disposição para “repensar o modelo”. Elas querem que a ANS deixe de fixar reajustes e pedem flexibilização das regras para poder vender planos mais modestos a preços menores, e mais completos a preços maiores, o que hoje não é permitido.

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