Notícias | 14 de julho de 2004 | Fonte: Gazeta Mercantil

Previdência, uma reforma que mal começou

Nas sociedades democráticas, a implementação de reformas estruturais não se dá como num passe de mágica. Mudanças profundas, que afetam a vida dos cidadãos, podem exigir longos períodos de debates até que sejam aprovadas pelo Legislativo e possam ser postas em prática. Foi o que ocorreu, por exemplo, com a reforma da Previdência Social dos Estados Unidos, implementada na década de 1970 após dez anos de discussão no Congresso norte-americano.

É sob esse prisma que se deve focar o resultado da reforma previdenciária do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Submetido ao Congresso, o “pacote” de propostas da reforma sofreu tantas modificações e “remendos” que seu alcance ficou muito aquém do pretendido. A questão previdenciária continua sendo uma das maiores preocupações dos empresários, uma vez que continua sendo a maior fonte de déficit público, depois dos juros. Como escreveu o empresário Antonio Ermírio de Moraes em artigo publicado no último domingo, “a própria reforma gerou despesas novas, como é caso do teto de contribuição para dez salários mínimos. Isso gera mais receita de curto prazo, mas os valores dos benefícios futuros serão muito mais altos e casados da arrecadação prevista.”

Assim, a reforma aprovada é apenas um passo, que deve ter seqüência até que se atinja uma ampla e profunda transformação, somente possível com uma transição para um sistema que também tenha o setor de previdência complementar como um dos seus pilares.

Esse tema foi amplamente debatido na conferência “Previdência, Poupança e Desenvolvimento”, patrocinada pela SulAmérica e organizada por Gazeta Mercantil, Jornal do Brasil e Revista Forbes, realizada em meados de junho em São Paulo com o apoio da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) da Universidade de São Paulo (USP).

O sistema de previdência complementar ? formado pelos fundos de pensão fechados, patrocinados por empresas privadas e estatais, e pelos planos de previdência abertos, geridos por seguradoras e empresas de previdência privada ?, exibem patrimônios vultosos.

O patrimônio dos fundos de pensão atualmente é de R$ 270 bilhões, segundo a Secretaria de Previdência Complementar (SPC). Eles têm como participantes cerca de 2,3 milhões de trabalhadores e incluem 1 mil planos, distribuídos por 358 fundos patrocinados por empresas privadas e estatais. O número de fundos dessa categoria vai aumentar com a criação dos fundos dos servidores públicos. O modelo para os funcionários da União está sendo estruturado e deverá nortear a instituição dos fundos do funcionalismo dos estados e municípios.

Além disso, a reforma de Lula também abriu caminho para a criação dos fundos instituídos por associações de classe e sindicatos. Dez fundos deste tipo já foram aprovados pela SPC, mas por enquanto só o do Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo iniciou a captação de recursos.

Um dos efeitos positivos dos debates em torno da reforma previdenciária, iniciados ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, é que fizeram as pessoas se conscientizarem da necessidade de não contar apenas com a aposentadoria paga pela Previdência estatal. Em decorrência, o mercado brasileiro vem registrando crescimento expressivo principalmente dos planos de previdência complementar comercializados pelas seguradoras ? os fundos abertos.

Em 1996, de acordo com a Associação Nacional de Previdência Privada (Anapp), o patrimônio do setor somava R$ 3 bilhões. No ano passado, havia crescido 10 vezes e até junho deste ano chegava a R$ 54 bilhões. Num cenário conservador em que não houvesse melhoria do desempenho da economia, a previsão do setor para 2006 é de que o patrimônio se eleve para R$ 100 bilhões, se a tributação não for elevada.

Tanto os fundos de pensão fechados ? instituições sem fins lucrativos ? quanto os planos de aposentadoria comercializados por seguradoras e entidades de previdência aberta defendem um tratamento tributário diferenciado para que a previdência complementar possa avançar ainda mais no País. Entre outras medidas, ambos reivindicam que o Imposto de Renda seja decrescente à medida que o prazo do investimento se alongar, para motivar as pessoas a deixar o seu dinheiro aplicado por mais tempo.

O fortalecimento da previdência complementar fechada e aberta, via incentivos, é fundamental para alavancar o nível da poupança interna e para propiciar uma redução do teto das aposentadorias e pensões pagas pela Previdência Social, que mais dia menos dia terá de ser adotada.

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