Notícias | 18 de março de 2004 | Fonte: Valor Econômico

Previdência sob medida

Os planos instituídos – nome dados aos planos de previdência formados por sindicatos e entidades de classe – são a grande aposta do governo para incluir 8 milhões de brasileiros que hoje teriam condições de ingressar no sistema de previdência complementar. Desde julho de 2003, foram criados cinco planos. O outros 14 estão em fase de aprovação.

Segundo o coordenador geral de Projetos Especiais e Fomento da Secretaria de Previdência Complementar (SPC), Carlos Alberto de Paula, atualmente, o sistema de previdência fechada conta com 2,3 milhões de participantes, detentores de uma poupança previdenciária ao redor dos R$ 240 bilhões. Em um primeiro momento, a intenção seria dobrar esse número dentro de cinco anos e depois chegar aos oito milhões potenciais candidatos ao sistema. “Cinco anos não pode ser considerado muito tempo, se levado em conta que o Brasil levou quase 20 anos para chegar aos atuais 2,3 milhões”, diz o coordenador

Mas se o governo aposta nos planos instituídos pelos sindicatos ou entidades de classes, o ritmo de crescimento do setor de previdência privada aberta continua. Dados da consultoria Austin Asis mostram que o setor atingiu a marca de 6,2 milhões de planos, sendo que mais de 1 milhão deles foram adquiridos apenas em 2003. Além do grande crescimento nas receitas, que atingiram R$ 14,869 bilhões, com crescimento de 53,56% sobre o montante de 2002, houve também aumento na Carteira de Investimentos, que passou de R$ 31,7 bilhões para R$ 48,5 bilhões – desempenho 52,75% superior ao resultado anterior.

O desafio da SPC é mostrar os atrativos da previdência complementar em relação à aberta, que não pára de crescer. Carlos Alberto de Paula explica que, desde julho de 2003 até o momento, cinco planos já foram aprovados e outros 14 estão em fase de análise. Ao somar os 19 planos, a Secretaria chega a um potencial de 750 mil participantes ativos dos instituidores – quase um terço do 2,3 mil participantes do sistema de previdência complementar. Pela regulamentação, os fundos instituídos têm 180 dias para ter um mínimo de 500 participantes, prorrogáveis por mais 180 dias.

Os profissionais liberais ou o sindicato, chamado de “instituidores”, podem constituir o plano de previdência para os associados, seja criando uma entidade fechada própria ou buscando parcerias com instituições já atuantes na área de previdência complementar. Paula afirma que no Brasil há cerca de 23,5 mil potenciais instituidores, incluindo nesse número dos sindicatos, cooperativas e órgãos de classes.

Quando o projeto de plano instituído é aprovado pela SPC, surge uma nova “pessoa jurídica”, da qual o sindicato é o instituidor . Esses planos devem seguir as regras dos fundos de pensão tradicionais: apresentar um conselho deliberativo, conselho fiscal e diretoria executiva. Juridicamente, os fundos de pensão também não têm fins lucrativos. Seguindo esse modelo, os instituídos também não devem visar ao lucro.

Por isso, é importante o investidor prestar atenção nas taxas cobradas. “Quando o sindicato opta por criar o plano instituído, terá um custo que sairá da taxa de despesa administrativa. Para diminuir os gastos, entidades de classe e sindicatos têm feito parcerias com outras instituições”, explica Paula.

Conforme a regulação dos fundos de pensão tradicionais, a taxa de despesa administrativa dos planos instituídos pode chegar à 15% sobre o patrimônio do fundo. A parceria é um meio de reduzir esses custos para cerca de 3% – percentual atualmente cobrado pelas empresas de previdência privada aberta. Por esse motivo, a Associação dos Ex-Alunos de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, por exemplo, buscou parceria com o Banco Alfa.

Segundo Carlos Alberto de Paula, a taxa de gestão financeira (chamada de taxa de administração nos fundos de previdência abertos) é menor nos fundos de pensão, variam de 0,5% a 1% (ver tabela). “No longo prazo, são elas que têm maior impacto sobre os rendimentos acumulados no fundo”, afirma.

Uma das exigências da SPC é para que o patrimônio dos instituídos seja completamente separado do patrimônio dos sindicatos ou entidades de classe. A gestão dos ativos tem de ser feita por uma instituição financeira”, explica Paula.

Nos planos instituídos, os investidores não podem optar pela renda vitalícia quando chega na fase de aposentadoria. Os consultores da área de previdência explicam que o montante depositado durante a fase de poupança será recebido mensalmente pelo participante do plano instituído, com correção e rendimentos. Caso o participante queira, a qualquer momento ele poderá sacar todo o dinheiro.

Normalmente, os planos abertos do mercado prevêem a possibilidade de comprar uma renda vitalícia, afirma Carlos Garcia, vice-presidente para a área de atacado da Icatu Hartford. “É como se o participante estivesse vendendo todo seu risco para a seguradora e pagando à vista (com o montante acumulado)”. Como ele estará livre do risco, o benefício tende a ser um pouco menor.

Outra novidade, ainda em estudo pela SPC, é a oferta de benefício de risco (aposentadoria por invalidez ou pensão por morte) no plano instituído. “Estamos em um estágio adiantado. Deve sair até o final de março”, afirma Paula.

A SPC quer também incentivar os grandes fundos de pensão já estabelecidos a administrar fundos de terceiros. Assim fez a Petros, que conquistou a gestão do fundo dos sindicatos dos médicos de São Paulo. Funcef, Eletros e Valia já declararam que estão preparadas para fazer o mesmo. “Esses fundos possuem décadas de experiência na administração de ativos que podem oferecer a esses novos planos”, pondera o secretário, Adacir Reis.

A novidade vem movimentando todo o mercado. O ex-presidente da Petros, Carlos Flory, montou uma assessoria para estruturar novos fundos. A Machado e Silva Consultoria Jurídica, especializada no atendimento a sindicatos, também pretende montar uma cartilha para seus clientes sobre os planos instituídos. “Temos muita demanda por essas informações. Acreditamos que os grandes sindicatos possam querer montar planos maiores, nacionais. Mas sindicatos mais regionais que reúnem entre 1 mil e 5 mil trabalhadores devem montar planos separados”, explica Felipe Santa Cruz, sócio da Machado Silva. Ele lembra, no entanto, que cada caso deve ser estudado com cuidado. “Por isso vamos fazer a cartilha e estudos muito cuidadosos, podem existir casos em que não seja indicado montar um plano”, avisa o advogado. Santa Cruz lembra ainda que, antes, os sindicatos nunca demonstraram muita preocupação com a questão da aposentadoria e por isso não recorreram a parcerias com seguradoras para fazer planos abertos.

Na visão dos dirigentes dos fundos de pensão, nos oito anos do governo passado o segmento de previdência fechada foi prejudicado. No governo Lula, acredita a associação do setor, a Abrapp, a coisa mudou de figura. O presidente da associação, Fernando Pimentel, lembra que no ano passado o segmento teve seu melhor desempenho nos últimos dez anos. “Outro sinal importante de retomada é a criação do fundo do Sebrae. Não me lembro do último fundo de porte criado antes desse. O sistema vinha tendo crescimento vegetativo. Agora, com os fundos que não necessitam de patrocinador, vamos ter muitos novos fundos”, afirmou Pimentel.

De fato, o secretário de Previdência Complementar, Adacir Reis, não esconde seu entusiasmo com os chamados fundos instituídos. Reis explica que esses fundos resgatam valores essenciais do planejamento da aposentadoria. “Eles valorizam o sentimento de coletividade e reforçam os trabalhadores como um grupo que possui identidade”, disse Reis durante um evento do setor no Rio. “Além disso, focam exclusivamente na aposentadoria, ou sejam, possuem um verdadeiro caráter de poupança previdenciária de longo prazo”, completou ele.

Autor: Adriana Aguilar e Catherine Vieira

FAÇA UM COMENTÁRIO

Esta é uma área exclusiva para membros da comunidade

Faça login para interagir ou crie agora sua conta e faça parte.

FAÇA PARTE AGORA FAZER LOGIN