A visão de Tolstoi, da luta dos russos contra a invasão do exército de Napoleão em 1813 é uma das mais marcantes para Jayme Garfinkel, presidente da Porto Seguro Seguros. De todos os livros que leu, “Guerra e Paz”, que descreve essa batalha, é o texto com que ele mais se identificou. “Mostra a solidão da liderança dos generais”, afirma o empresário. Resgata um sentimento dele, relacionado à forma como foi alçado, aos 25 anos, a um cargo executivo da empresa do pai, AbrahãoGarfinkel, um homem “poderoso” aos olhos do rapaz que havia acabado de sair da faculdade de engenharia civil.
Sua única experiência profissional até então havia sido uma breve passagem como estagiário em uma construtora chamada Luz-Ar. Em 1978, quando Abrahão faleceu, Jayme assumiu o comando da seguradora. Ele sabe que não é possível fugir da “solidão da liderança”. A palavra final e a responsabilidade da decisão sempre terão que ser dele. Mas adotou como filosofia de trabalho ouvir muito todos os parceiros do negócio, dos diretores – com os quais se reúne diária e religiosamente, sempre às 8 da manhã – aos corretores. “Acredito muito no processo de trocar idéias, envolver as pessoas”, afirma.
Oficialmente, Jayme divide o comando da companhia com a mãe, Rosa Garfinkel. Respeitada no mercado segurador, Rosa supera diariamente seus mais de 80 anos para comparecer ao trabalho e ajudar o filho a tocar a companhia.
A Porto Seguro, quinta maior seguradora do país, vice-líder em automóveis depois da Bradesco Seguros, tem uma história muito ligada ao seu maior concorrente. Fundada em 1945, ela pertenceu ao grupo do fundador do Bradesco, Amador Aguiar, que depois a vendeu ao empresário Quirino Ferreira Neto. Na década de 70, Abrahão era diretor da Cia. Boavista de Seguros,quando esta foi vendida para o grupo Bradesco – até hoje a Boavista é uma das empresas do grupo Bradesco Seguros. Incomodado com a venda da Boavista, Abrahão decidiu deixar a companhia e fundar sua própria seguradora. Comprou, então, das mãos de Quirino, a Porto Seguro.
Reconhecida por corretores, segurados e até concorrentes pela alta qualidade da prestação de serviços acoplada às apólices – atendimento 24 horas, guincho, apoio integral em caso de acidentes (logístico e jurídico) – a Porto vem agregando nos últimos anos uma série de itens de atendimento também à residência dos clientes do seguro de automóveis, produto chamado comercialmente de “Carro + Casa”. Quem tem seguro do carro com a Porto ganha gratuitamente serviços de chaveiro, encanador, eletricista e até um vigia temporário para a residência quando o segurado viaja.
“A idéia é batalhar sempre pela liderança no mercado de automóveis”, afirma Garfinkel. A carteira de automóveis representa 65% do faturamento em prêmios da Porto. Mas ele já começou a preparar uma nova rota. Além de ampliar a atuação em produtos do conjunto de seguros de pessoas (vida, acidentes pessoais, saúde, residência e previdência), a Porto está sendo transformada em uma empresa de serviços financeiros. No ano passado, abriu uma financeira, a PortoSeg, acelerou as vendas de consórcios, passou a vender fundos de investimentos através da PortoPar, e fez sua primeira aquisição: toda a operação da seguradora francesa AXA no Brasil.
Em um contexto mais amplo, a Porto se prepara também para o grande desafio de médio e longo prazo das seguradoras brasileiras: conviver com taxas de juros mais baixas. Há anos que quase todas as companhias – inclusive a Porto – têm prejuízo operacional, amplamente compensado pela aplicação do dinheiro pago em prêmios pelos segurados no mercado financeiro. Com a queda dos juros, essas aplicações tendem a não render tanto que compense o prejuízo operacional. Será a hora em que as seguradoras terão que lucrar mais com vendas, o que deve acirrar a já forte concorrência.
Janes Rocha