Notícias | 8 de janeiro de 2004 | Fonte: Folha de São Paulo

Os trabalhadores e a Previdência

O ano de 2003 foi marcado pelo maior debate já ocorrido no país sobre a Previdência Social e sua importância para um Brasil mais justo e solidário. A sociedade foi chamada a compreender a estrutura do sistema previdenciário, com suas complexidades e demandas, bem como os problemas herdados pela atual administração e as propostas do governo para corrigir essas distorções. Nos últimos anos, o debate sobre a necessidade de financiamento na Previdência tem se acirrado. Fala-se sempre em déficit do INSS, como se o sistema devesse se financiar apenas pelas contribuições sobre a folha de pagamento. A lógica inclusiva da Previdência Social, expressa na Constituição Federal, determinou que seu financiamento deve compartilhar com a Saúde e a Assistência Social os recursos das contribuições sociais (Cofins, CSLL e CPMF). Se não fosse assim, não seria possível pagar as aposentadorias especiais rurais nem as aposentadorias urbanas por idade. Esses benefícios seriam inviáveis e seus detentores estariam na miséria. O INSS paga 21,5 milhões de benefícios mensais, sendo quase 2 milhões de amparos assistenciais. Os benefícios previdenciários afetam positivamente a vida de 75 milhões de pessoas, elevando a renda familiar. A Previdência é, no âmbito da União, a que mais contribui com as economias locais, com a inclusão social. Entre as cem cidades brasileiras com maior IDH, 88 recebem mais recursos da Previdência do que do Fundo de Participação dos Municípios. Só em 2003, o INSS repassou R$ 17,7 bilhões por meio das aposentadorias rurais. Ao longo do ano, a Previdência Social pagou R$ 107 bilhões em benefícios. Para o atendimento geral da população, mantém 1.147 agências, seis barcos na Amazônia e 69 microônibus para atender os locais mais distantes. Desde dezembro de 2003 não há mais lugares em que a Previdência não alcance seu beneficiário. O INSS fez parcerias com os Correios e pequenos comerciantes para que façam o pagamento de benefícios nos 320 municípios onde ainda não eram feitos, evitando que o segurado ou aposentado vá para outras cidades a fim de receber e ali faça suas compras. O debate sobre a reforma da Previdência, ao longo de 2003, pautou-se pela lógica de alocação orçamentária justa e objetiva. Qualquer subsídio orçamentário à Previdência deve se dirigir aos que não podem pagar plenamente, como, por exemplo, a maioria dos trabalhadores rurais. A natureza dessa discussão foi compreendida pela opinião pública, que apoiou as mudanças. Um dos grandes avanços na tramitação da reforma previdenciária foi o reconhecimento da necessidade de trazer para a Previdência, por meio da redução da contribuição, grande parte dos 40 milhões de trabalhadores economicamente ativos sem proteção social. São pessoas que, diante de qualquer risco social, como uma doença ou um acidente, e mesmo na maternidade, ficarão temporariamente sem renda e, em caso de morte, não deixarão pensão às suas famílias. O debate que o governo introduziu no seu primeiro ano lembrou à própria sociedade que ela é responsável pelo tipo de previdência que deseja e por quanto está disposta a pagar por ela. Cabe a todos nós subsidiar a inclusão social, por meio dos impostos e contribuições. O Estado brasileiro, como todo Estado nacional, tem por objetivo proteger seus cidadãos, sem distinção de classes sociais. À Previdência, como órgão deste Estado, cabe incluir o máximo de trabalhadores em seu sistema, mesmo que para isso assuma alguns subsídios, como o dos trabalhadores rurais, que contribuem todos os dias de maneira direta ou indireta com o alimento que chega à mesa de todos nós. No debate sobre a Previdência, muitas vezes prevalecem números e estatísticas. Mas é sempre bom lembrar que atrás dos gráficos estão seres humanos. E nossa gestão quer destacar as pessoas que contribuem para a sobrevivência de outros milhares de pessoas, como as mães que sustentam seus filhos sobrevivendo de pequenos serviços. Ao assumir o ministério, encontrei uma máquina desarticulada e desmotivada. A prevenção e o combate às fraudes praticamente inexistiam. Instalamos as forças-tarefas, com a participação do INSS, da Polícia Federal e do Ministério Público, para agilizar o combate às fraudes e punir os criminosos. Cabe registrar que ainda há muito o que avançar na gestão previdenciária. No ano passado, além da própria reforma, tivemos muitas dificuldades estruturais e alguns tropeços. Mas as transformações exigem persistência e humildade. Se trabalharmos com afinco, superaremos décadas de descaso e surgirá uma nova Previdência. Um país desigual e injusto como o Brasil precisa enfrentar seus grandes desafios e alcançar um status de sociedade justa e solidária. A Previdência é estratégica para esse objetivo. Trabalhar por essa meta é para nós apenas o início da virada, o começo de uma mudança de compreensão do papel do Estado.

Autor: Ricardo Berzoini, 43, deputado federal licenciado pelo PT-SP, é o ministro da Previdência Social. Foi presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo.

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