Notícias | 27 de agosto de 2020 | Fonte: CQCS | Sueli Santos

Mercado de seguros deve ter carteiras mais enxutas

Reportagem publicada no jornal Valor Econômico ouviu diversos executivos das principais seguradoras do mercado brasileiro para apontar a tendência do que vai acontecer nos próximos meses.

O jornal mostra dados do mercado e diz que antes da pandemia, os números mostravam que o avanço nominal de 12,1% nas receitas em 2019 emulava o desempenho do período 2009-2014, em que crescimentos anuais de dois dígitos eram comuns. A expectativa para 2020 era, senão repetir o desempenho, ao menos entregar bons resultados já que a economia ensaiava uma recuperação.

Mas a pandemia impôs o isolamento social que reduziu o fluxo de transporte de mercadorias, fechou o comércio, aumentou o desemprego e corroeu a renda de 63,9% dos brasileiros, conforme a Fundação Getulio Vargas (FGV). As seguradoras sentiram o baque.

Dados da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) mostraram que a receita em prêmios e contribuições (excluídos DPVAT e saúde suplementar) caiu 3,5% no primeiro semestre, em relação a igual período do ano passado, para R$ 121,1 bilhões.

No segundo trimestre versus o mesmo intervalo do ano passado, a arrecadação recuou 13,8%. Abril, o primeiro mês “cheio” da quarentena, foi considerado um dos piores da história recente do segmento. Houve aparente melhora em maio, com crescimento de 11,4% na arrecadação sobre abril, mas os números precisam ser relativizados, na opinião de Marcio Coriolano, presidente da CNseg, que foi ouvido pelo jornal, os resultados foram influenciados pelos produtos previdenciários. “Sem PGBL e VGBL, haveria queda de 2,3%”, afirmou o dirigente ao jornal.

A melhora em carteiras como previdência, automóvel e vida trouxe um alívio em junho, mês em que as receitas não apenas avançaram em relação a maio (32,9%), mas também sobre o quinto mês de 2019 (5,9%). Ainda é cedo, entretanto, para cravar que o pico da crise tenha ficado para trás. Na base móvel dos últimos 12 meses até junho, o setor ainda mantém vigor, por conta de efeito de carregamento estatístico: alta de 6,1%. Coriolano disse que o país vive um período duro já que o consumidor tem poder aquisitivo menor. “O país empobreceu”, afirmou Coriolano.

Para o presidente da Bradesco Seguros, Vinicius Albernaz, que também foi ouvido pela reportagem, o cenário é desafiador. Para o executivo, embora a pandemia tenha ocasionado uma queda significativa nos volumes de arrecadação em alguns ramos relevantes, como automóveis, houve compensação com uma menor incidência de sinistros. Isso se refletiu positivamente nos balanços de muitas seguradoras”, completa.

Usando dados da CNseg, a reportagem mostra que a pandemia contribuiu com a redução atípica nos índices de sinistralidade no segmento de danos e responsabilidades, de 55,8% para 49% nos primeiros semestres de 2019 e 2020, influenciada pela redução de acidentes e roubos de carros.

Outro executivo ouvido pelo jornal, Fabio Oliveira, presidente da AIG no Brasil, disse que apesar de os seguros de pessoas não terem apresentado bom resultado, os seguros corporativos foram bem. “O seguro cyber teve aumento de cotações e contratações. Conseguimos compensar a falta de novos negócios com aumento de taxas nas renovações”, afirmou.

Já os ramos que são mais ligados à renda e emprego sentiram os maiores impactos da pandemia, como o seguro de automóvel que tem a maior carteira do setor no segmento de danos em volume de prêmios e fechou o semestre com queda de 5,8% na arrecadação, conforme a Superintendência de Seguros Privados (Susep). O ramo é especialmente sensível à venda de veículos novos que registraram um tombo de 38,2% na comparação semestral, aponta a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). A estimativa da entidade é que as vendas totalizem 1,6 milhão de unidades de 0 km em 2020, o patamar mais baixo desde 2005.

Outro aspecto levantado pela reportagem, diz respeito aos ramos que que tiveram crescimento em 2019, como vida e previdência privada, que também foram atingidos pela recessão. Segundo o jornal, até junho, os resgates subiram e as contribuições caíram nos planos de previdência complementar dos tipos PGBL e VGBL.

Segundo o jornal seguradoras e resseguradoras tiveram que lidar também com o pagamento de indenizações por efeito direto da pandemia, ainda que em poucas linhas de negócios – a maioria das apólices exclui eventos como pandemias das coberturas.

O exemplo citado são as coberturas que garantem indenização às empresas pela paralisação dos negócios (lucro cessante). As apólices estabelecem como gatilho para o acionamento da cobertura a ocorrência de um dano físico, como um incêndio, que leve a perda de receitas. A interrupção de um negócio em virtude da pandemia, assim, não é coberta na maioria das apólices.

Outros ramos, entretanto, foram mais pressionados, como o seguro-viagem e saúde. Ainda que o impacto da covid-19 na rede privada tenha sido menor, na comparação com a rede pública, as seguradoras de saúde tiveram gastos adicionais para cobrir a demanda por exames, tratamentos e internações decorrentes da covid-19.

Nas linhas financeiras, uma carteira impactada é a de seguro de crédito, produto que protege o comprador em um eventual calote em um contrato de compra e venda. No Brasil, o seguro tem baixa penetração e é operado por apenas seis empresas, a exemplo de Euler Hermes, Coface e AIG. “Houve muita prorrogação de prazos pelas seguradoras e acordos entre compradores e vendedores. Pensávamos que seria uma catástrofe de sinistros, mas isso ainda não ocorreu”, diz Tatiana Moura, diretora de crédito e garantia da Marsh Brasil.

É consenso no mercado que que ainda é difícil mensurar os impactos futuros da pandemia. Embora o pior das projeções pareça ter ficado para trás, a expectativa é que o Produto Interno Bruto (PIB) recue 5,52% em 2020, de acordo com a mais recente projeção do boletim Focus, do Banco Central (BC).

A taxa de desemprego atingiu 13,3% ao fim do segundo trimestre, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Gabriel Portella, presidente da SulAmérica, disse ao jornal que no Brasil, nunca se pode dizer que o pior já passou. “Sentimos em algumas das empresas seguradas a redução do número de beneficiários em saúde, mas os sinais não são desesperadores. Será uma retomada lenta.”

Segundo o jornal, há uma preocupação que, em um momento de receitas comprimidas, a flexibilização do distanciamento social tende a retomar procedimentos eletivos na saúde e levar mais carros para as ruas, com incremento natural da sinistralidade. “Não temos visibilidade, mas a tendência é de recuperação de aviso de sinistros em velocidade superior à da retomada de prêmios”, diz Albernaz, da Bradesco.

Como precaução, a seguradora formou provisões de R$ 1,1 bilhão no primeiro semestre, à espera de uma retomada da sinistralidade e um cenário econômico desafiador.

Em um ambiente de deterioração da renda e emprego, as seguradoras foram flexíveis nas condições de pagamento, com maior oferta de descontos, alongamento de prazos e parcelamentos e em alguns casos, postergação de reajustes. A SulAmérica represou os reajustes em maio, junho e julho para os planos de saúde individuais e PME. A Allianz Seguros facilitou as condições de pagamento, com parcelamentos em dez vezes sem juros em ramos como automóveis e PME. “Muitos clientes buscaram essa flexibilização e decidimos manter as condições até assegurarmos que a situação melhore”, diz o presidente da companhia, Eduard Folch.

Murilo Riedel, presidente da HDI Seguros, também foi ouvido pela reportagem e disse que a renovação virou um ativo preciosíssimo. “No Brasil, a renovação média de uma seguradora é de 65% a 70%. Nos EUA, de 90%. Cliente novo será mercadoria rara no rara nos próximos meses”, afirmou o executivo.

Riedel disse ao jornal que a covid-19 antecipou cinco anos de história para o mercado de seguros. A HDI iniciou o projeto de transformação digital em 2017, o que consumiu R$ 300 milhões em investimentos. “A rede de 24 mil corretores teve uma curva de aprendizagem gigantesca na pandemia com o uso de ferramentas tecnológicas. Houve melhoria tanto nas renovações quanto nos timings das ofertas”, diz Riedel.

Em maio, a seguradora e a gestora Redpoint eventures investiram US$ 6,5 milhões na startup Accountfy, que atua com digitalização das áreas financeiras das empresas. “Acreditamos que 25% dos negócios da HDI serão gerados pelo ecossistema até 2025, em ramos ligados ou não a seguros. Hoje, as parcerias respondem por 5% da arrecadação” diz.

A Allianz Seguros lançou um programa para otimizar a relação com corretores e clientes, o que inclui declaração de sinistros pela internet. Durante a pandemia, a estratégia digital contribuiu para os bons resultados operacionais no primeiro semestre. A arrecadação da carteira de automóveis cresceu 12,5% e a da residencial avançou 47,1%, em relação igual período do ano passado.

“A digitalização impactou positivamente nos resultados. O cenário coincidiu com a mudança de alguns produtos, mais eficientes e simples de contratar, com patamares de preços mais ajustados, em particular de automóveis”, afirma Eduard Folch.

Na SulAmérica, os investimentos em novas tecnologias realizados a partir de 2015 no app de saúde colheram os frutos durante a pandemia. Em fevereiro, foram registrados 500 atendimentos a distância na plataforma de telemedicina “Saúde na Tela”, números que chegaram a 68 mil em junho. “Também ampliamos a rede de médicos, o que trouxe alternativa de de renda para os profissionais se manterem ativos, mesmo à distância”, afirma Gabriel Portella.

O jornal diz que a pandemia não impediu que o mercado interrompesse a rota de reposicionamento que impulsionou as transações de fusão e aquisição (M&A, na sigla em inglês) nos últimos três anos, com empresas adquirindo concorrentes ou vendendo carteiras não- prioritárias para companhias que se concentraram em áreas de maior expertise.

O fenômeno também inclui joint-ventures, vendas cruzadas de produtos e parcerias, um movimento que Marcio Coriolano, da CNseg, batizou de “revolução silenciosa” do mercado de seguros.

Uma atividade econômica debilitada, margens apertadas em um cenário de juros baixos e a necessidade dos players de aumentar as fontes de receita, racionalizar custos, acessar novos mercados e acelerar a estratégia de inovação tecnológica explicam essas movimentações.

Os exemplos se avolumam. Em 2018, a Porto Seguro anunciou parceria estratégica de longo prazo com a AIG para comercializar produtos como D&O e responsabilidade civil (RC) para o segmento PME. Outro acordo, firmado em 2019, prevê a utilização da base de corretores da HDI para a comercialização de seguros de vida e acidentes pessoais da Icatu.
A Liberty Seguros renovou em julho parceria com o Banco Inter que garante a exclusividade na distribuição de seguros pelo prazo de 15 anos.

“O potencial do mercado brasileiro, ainda subpenetrado, explica essas movimentações”, afirma Portella, da SulAmérica. Na negociação mais recente, sacramentada em julho, a SulAmérica vendeu as operações de automóveis e de ramos elementares à Allianz por R$ 3,18 bilhões.

O acordo incluiu a transferência das carteiras, tecnologias, processos e 1.700 colaboradores. A SulAmérica passa a se posicionar estrategicamente como uma seguradora de riscos pessoais (saúde, odonto, vida, previdência e gestão de ativos).

Para a Allianz, a aquisição acrescenta 1,6 milhão de veículos na carteira e catapulta a companhia do oitavo para o segundo lugar no ranking de seguros de automóveis – a líder é a Porto Seguro. A decisão de comprar toda a operação, em uma das maiores transações do setor nos últimos anos no Brasil, é agregar produtos licenciados, tecnologias e capital intelectual da SulAmérica, incluindo 300 profissionais da área comercial. “O Brasil é um mercado atrativo para as seguradoras e que nos permite ganhar escala. Os grupos, locais e internacionais, estão se reposicionando para isso”, diz Folch.

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