Notícias | 21 de novembro de 2005 | Fonte: Gazeta Mercantil

A profissionalização da Previdência

Urge uma nova revisão que leve em conta as concessões dos últimos oito anos. Lamentavelmente, no Brasil, o tema Previdência passou a ser tratado somente quando o governo enumera soluções para o déficit das contas públicas ou quando se descortinam algumas das mazelas de seus regimes, como fraude, corrupção, mau uso do dinheiro público e desperdício. É assim tanto no Regime Geral da Previdência Social, conhecido pela sigla INSS, quanto na previdência complementar, por meio dos fundos de pensão. Fora disso, o tema submerge.

Há pouco retornou à pauta pelas denúncias de interferência política e envolvimento dos fundos de grandes estatais no escândalo do `mensalão` e também a bordo do chamado `déficit nominal zero`, através do qual o Ministério da Fazenda se propõe a zerar o déficit da Previdência Social em cinco anos.

Mas nem sempre foi assim. No Legislativo, uma reforma integral baseada em doutrinas e fundamentos universais – quer dizer, aplicar o que se faz em todos os países com Previdência Social organizada – começou a ser proposta em 1992. Na época, elaboramos um projeto com a colaboração do então deputado federal Nelson Jobim, além dos parlamentares Almir Gabriel e Eduardo Jorge.

Três anos e muitas resistências depois, apresentou-se ao Congresso uma reforma politicamente possível, mas não a correta. Na verdade, era mais uma colcha de retalhos, uma tentativa de organizar a Previdência dentro de padrões corretos, que não eliminava o déficit em curto prazo, este uma ameaça real ao crescimento da economia nas próximas décadas.

O último grande debate sobre o tema ocorreu em 2003, com um projeto equivocado do Executivo. Na ocasião, propunha-se, pretensamente, uma ampla reforma administrativa englobando questões básicas e equacionando inclusive o déficit previdenciário, estimado, então, pelo próprio governo federal, em quase R$ 80 bilhões ao ano. Dois anos depois, contudo, quase nada mudou, além dos problemas que se agravaram.

Na verdade, vendeu-se a ilusão à sociedade de que seria uma grande reforma, quando se tratava apenas da alteração de alguns pontos do regime dos servidores públicos. E, mesmo assim, a pouca eficácia dessa chamada reforma acaba de ser neutralizada com a PEC Paralela, recentemente aprovada no Congresso.

Outra discussão digna de registro, ocorrida há alguns meses, envolveu o déficit do fundo de pensão da Petrobras, a Petros, de quase R$ 10 bilhões – recursos quase que suficientes para construir uma grande hidrelétrica. Explicações absurdas foram oferecidas à sociedade e, em seguida, o assunto desapareceu.

Agora que a Previdência Social retorna à pauta, é fundamental se ater ao que é de fato importante. Ou seja, entender que a Previdência é composta, basicamente, de quatro grandes regimes: o do INSS; o regime dos servidores públicos; o dos fundos de pensão; e o dos militares, incluindo neste as polícias militares estaduais. E cada regime tem características e problemas próprios e específicos.

Cumpre observar alguns conceitos: o primeiro é que existe um conhecimento universal expresso na doutrina, nos princípios e nos fundamentos básicos; e o segundo, sob o aspecto operacional, é que a Previdência Social necessita ser estruturada e gerenciada de forma rigorosamente profissional. Ou seja, não é para políticos.

Tratando apenas da discussão sobre o INSS, a correção do déficit é inviável apenas por meio de algumas medidas administrativas. O regime carece, sim, de um conjunto de ações num processo contínuo. E isso deve ser feito o mais rapidamente possível. É que, em nenhum momento, o Instituto se apresentou com tantas dificuldades e tão poucas perspectivas de melhoria como atualmente. Uma conclusão que está baseada em minha passagem pela Previdência por três vezes, entre 1974 e 1998.

Dentre as questões básicas que deverão influenciar as decisões e ações futuras está a estrutura operacional e gerencial do órgão que beira o caos, levando a enormes prejuízos. Isso reflete na diminuição da eficiência da arrecadação e da cobrança de dívidas. Uma combinação que, na área de perícia médica, por exemplo, pode trazer perdas de bilhões de reais. Além disso, à medida que aumenta o nível de corrupção, o atendimento piora.

É importante que, paralelamente aos procedimentos de revisão, se analise também as causas que levam às fraudes e se adote mecanismos de prevenção. Se na revisão feita no passado esses mecanismos foram adotados, mas novas fraudes ocorreram, pode ter havido mau gerenciamento desses mecanismos. Portanto, deve-se proceder a uma nova revisão para atingir as concessões realizadas nos últimos oito anos, assim como reformular os procedimentos.

Agora, cabe ao governo, à classe política e à sociedade como um todo – incluindo a imprensa – conduzir com maior racionalidade esse debate, caracterizando com mais clareza os problemas e soluções possíveis para cada um desses regimes.

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