Diálogos com o direito do seguro | 10 de janeiro de 2020 | Fonte: Angélica Carlini

OBRIGATORIEDADE DO ROL DA ANS – DECISÃO DO STJ

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, em data de 10 de dezembro de 2019, decidiu que os planos de saúde não são obrigados a custear procedimentos não previstos no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar, a ANS.

O rol de procedimentos foi considerado pelo STJ como taxativo e não meramente exemplificativo e, nessa diferença reside todo o apreço que o tribunal demonstrou pela boa técnica atuarial que deve embasar as atividades de seguro em qualquer ramo de operação.

O cálculo atuarial para fixação dos valores do fundo mutual de onde sairão os valores necessários para custeio das consequências dos riscos ocorridos durante a vigência do contrato, é organizado a partir  de riscos predeterminados, anteriores ao início de vigência do contrato.

Essa é a determinação do artigo 757 do Código Civil brasileiro que prevê expressamente que, o contrato de seguro é aquele em que o segurador, mediante o pagamento de um prêmio, garante o interesse legítimo do segurado em relação a bens e pessoas, contra riscos predeterminados.

A predeterminação de riscos é fundamental para que o cálculo atuarial seja correto porque a partir do estudo dos riscos, é possível estudar as estatísticas e fixar probabilidades que, ao fim, determinarão os valores necessários para que o fundo mutual tenha recursos para pagamento das indenizações e, custeio de procedimentos no caso das operadoras de saúde suplementar.

A compreensão desse aspecto técnico e atuarial é fundamental para que o poder judiciário atue de forma a garantir que sejam pagos todos os valores a que o segurado tem direito, porém levando-se em conta que os fatos que ensejam a utilização dos valores do fundo mutual devem ter sido previamente especificados.

Se o rol de procedimentos dos planos de saúde tiver caráter exemplificativo, não haverá segurança para que os cálculos de provisão dos fundos mutuais sejam realizados e, a consequência imediata dessa ausência de previsão é a possibilidade real dos fundos se tornarem insolventes, ou seja, não contabilizarem os recursos necessários para as despesas de saúde necessárias para o atendimento dos usuários.

Evidentemente que todos nós gostaríamos de dispor de recursos infinitos para cuidar de nossa saúde. Diante de um quadro de doença todos desejamos utilizar todos os recursos médicos, nacionais ou internacionais, para tentar curar o mal que nos aflige. A realidade é que se utilizarmos nossos próprios recursos, podemos utilizá-los da forma como julgarmos mais adequada. No entanto, quando utilizamos recursos comuns, que pertencem a um grupo, temos regras para cumprir e deveres para honrar.

Ser segurado é ser parte de um fundo mutual composto por outras pessoas, expostas a riscos semelhantes aos nossos. Temos o direito de utilizar os recursos da forma como prevista na lei e no contrato, porém temos o dever de respeitar os limites de utilização de cada um. O rol de procedimentos da ANS é um desses limites, embora seja um limite flexível porque é atualizado a cada dois anos.

O caráter taxativo do rol não representa redução ou limitação de direitos, até porque não seria uma regra infralegal, de caráter regulatório, capaz de limitar os direitos constitucionais do cidadão brasileiro e do estrangeiro residente no país.

O fato do rol de procedimentos da ANS ser taxativo significa apenas que ele estabelece regras para a utilização de recursos comuns, para os quais contribuíram todos os usuários daquela operadora de saúde. E quando várias pessoas se reúnem para algum tipo de atividade, é primordial que tenham regras de organização e administração, sob pena de não conseguirem concretizar seus propósitos.

Ninguém perde com a taxatividade do rol reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça. Ao contrário, os fundos mutuais organizados pelas operadoras de saúde ganham em solvência e confiabilidade e, com isso, ganha toda a sociedade.

Os grupos sociais mais admirados por nós são aquele organizados e eficientes na consecução de seus objetivos. Que esse modelo de respeito às regras de organização seja sempre seguido por todos como forma de contribuirmos para a construção da tão almejada paz social.

Que 2020 seja um ano organizado e eficiente para o setor de seguros e para todos nós.

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Advogada especializada em Direito do Seguro. Sócia e Diretora de Carlini Sociedade de Advogados. Docente do ensino superior. Doutora em Direito Político e Econômico. Doutora em Educação. Mestre em Direito Civil. Mestre em História Contemporânea. Pós-Doutorado em Direito Constitucional. Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Contratual.

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